
(Foto: Rádio Fique na Luz)
Francisco faz sínodo 'conciliar' que une mundo todo
Sínodo sobre a sinodalidade que começou no último sábado, 9 leva fiéis do mundo todo a refletir sobre a própria Igreja.
Basílica de São Pedro lotada como há muito não se via. Diante dos nossos olhos, um momento histórico. Cardeais, bispos e famílias inteiras reunidas para refletir, até 2023, quais os rumos a Igreja Católica deve tomar daqui para frente. Um sínodo com cheiro de Concílio. E um dos maiores da história, desde que o escritório permanente do sínodo dos bispos foi instituído por Paulo VI, em 1965.
Os protagonistas, como acontecia até aqui, não serão mais bispos e religiosos reunidos no Vaticano por um mês. Mas o padre da sua comunidade e você mesmo, que é católico, atua na sua paróquia, e lê este texto. As dioceses farão um verdadeiro mutirão de discernimento e escuta.
Como bom jesuíta, o Santo Padre, neste domingo, traçou aos participantes não só qual será o itinerário espiritual desse sínodo, mas pediu atitudes concretas. Disse claramente quais são suas expectativas para essa assembleia, que é a ‘cereja do bolo’ de seu projeto de reforma. Se a Igreja é universal, que faça jus ao nome. Se a Igreja Católica é constituída por todos, independente do cargo que cada um ocupe, que todos sejam ouvidos.
“Fazer sínodo significa caminhar pela mesma estrada, caminhar em conjunto. Encontrar, escutar, discernir: três verbos do Sínodo, nos quais quero me deter. [...] Estamos prontos para a aventura do caminho ou, temerosos face ao desconhecido, preferimos refugiar-nos nas desculpas «não adianta» ou «sempre se fez assim»?”, disse o Papa.
Um dos peritos do sínodo sobre a sinodalidade, o teólogo Rafael Luciani, fala de como essa assembleia, em especial, quer promover uma mudança de mentalidade em relação à própria Igreja. “É uma nova forma de a instituição pensar sobre ela mesma”, explica.
“É a eclesiologia do povo de Deus em uma nova recepção. O que isso significa? Que leigos e leigas, religiosas e religiosos, os bispos e o Papa somos todos fiéis, christifideles e, portanto, essas novas relações horizontais marcam essa nova relação, essa nova forma de ser Igreja. E a chave dessa sinodalidade não é somente escutar, mas também incluir nos processos de participação da vida eclesial, da elaboração das decisões ao discernimento e ao consenso eclesial”, ressalta Luciani.
O teólogo venezuelano, que atua como assessor teológico do CELAM (Conferência Episcopal Latino-Americana) e também participou do Sínodo sobre a Amazônia, de 2019, é secretário da comissão teológica do sínodo que está em curso. Junto com ele estão os teólogos Agenor Brighenti, do Brasil, e o argentino Carlo Maria Galli. Luciani destaca que essa é assembleia é diferente das outras não somente por causa do formato, mas porque se trata da maior iniciativa de continuidade do próprio Concílio Vaticano II.
“Este sínodo não foca em um tema específico, como os anteriores (da família, dos jovens, da Amazônia, etc), mas é um sínodo sobre a Igreja. E é sobre a Igreja porque a sinodalidade é uma essência, o elemento constitutivo, o que faz a Igreja. Por isso, o que estamos refletindo, e o que estamos discernindo, é como criar um modelo institucional de Igreja para o terceiro milênio. E isso não é qualquer coisa. Por conta disso, é um sínodo que exige muito, exige conversão, porque as mentalidade que trazemos devem ser transformadas para que possamos corresponder aos sinais dos tempos atuais”.
Pensar nesse sínodo em especial, como o pontífice ressaltou nas duas colocações que fez neste fim de semana, é traçar um caminho de mudança. A palavra assusta os opositores de Francisco, mas a história do catolicismo, com suas luzes e sombras, também é feita de reformas, de um constante “aparar as arestas”, apesar dos percalços.
A diferença é que, após o último grande concílio ecumênico de 1962, elas não servem para satisfazer os interesses da cúria ou de um grupo restrito. O problema é que muitos ainda não se atentaram ao fato que a própria instituição rompeu, formalmente, com um modelo de societas perfecta autorreferencial que rejeitava qualquer possibilidade de atualização a partir do momento em que João XXIII estreou essa nova era.
De maneira concreta, Luciani elenca quais seriam as mudanças a serem discutidas ao longo desse caminho sinodal, que termina em 2023.
“Uma participação ativa de leigas e leigos, não só em âmbito pastoral, mas em conselhos diocesanos. Embora esses organismos contem com algumas dessas pessoas, elas acabam não constituindo, muitas vezes, parte integrante da vida da Igreja. E isso seria um passo à frente. Que nas estruturas eclesiais possamos sentar e chegar a um acordo sobre como poderá ser essa missão da Igreja. Não que seja aquela coisa elaborada somente pela autoridade e nós a tenhamos que executar. Como diz o papa Francisco, ao falar sobre as mulheres, numa mensagem em vídeo, que elas não assumam simplesmente funções de governo e administrativas, mas que elas também ocupem espaços onde possam ter voz ativa na tomada de decisões”.